Migalhas: Nova política de preços da proposta mostra-se uma solução promissora frente ao alto custo dos combustíveis no Brasil. Claramente inspirada por experiências internacionais, como por exemplo o Chile, que, desde 2014, passou a apostar no mecanismo automático de tributação.
Em março de 2021, o Deputado Nereu Crispim (PSL/RS) apresentou o PL 750/2021, que altera a lei 9.478/97, para estabelecer política de preços de derivados de petróleo. O Projeto cria o Fundo de Estabilização dos Preços dos Derivados de Petróleo (FEDP), cuja fonte de arrecadação seria proveniente do imposto de exportação de petróleo bruto. O objetivo é reduzir a volatilidade dos preços dos derivados do petróleo no mercado interno, com garantias de subvenções econômicas às refinarias e aos importadores.
Há a previsão de alíquotas progressivas no imposto de exportação, conforme o valor do barril. Até US$ 40, a alíquota é 0; até US$ 70, 30% apenas sobre a parcela superior a US$ 40; e de 50% naquilo que exceder US$ 70 por barril. Segundo o autor o projeto, a incidência de imposto de exportação sobre o petróleo bruto é uma forma de se incentivar a construção de refinarias no País, garantir a autossuficiência em derivados e constituir uma reserva monetária para reduzir e estabilizar o preço dos derivados no mercado interno.
A iniciativa do Legislativo visa mitigar a flutuação do preço dos combustíveis ao consumidor causada pela volatilidade do preço internacional do barril do petróleo. Atualmente, a administração da Petrobrás, empresa que controla o mercado, teria que adotar o modelo de Preço de Paridade de Importação (PPI), e assim, cobraria pelo derivado do petróleo como se todo ele fosse produto de refino de matéria-prima importada, somando, ainda, gastos como frete, taxas portuárias, seguros, entre outros.
O projeto surge dentro de um contexto de crise econômica por conta da pandemia de Covid-19 e de escalada quase exponencial dos preços dos combustíveis. Ademais, segundo o autor do projeto, o Brasil é praticamente autossuficiente em derivados como óleo diesel e gasolina, quadro que torna injustificável o critério de preço estipulado pela política de PPI, que, no fim, prejudica a sociedade ao cobrar das distribuidoras nacionais um preço maior pelo combustível do que aquele praticado no mercado internacional.
Todavia, na prática, como a Petrobrás não segue o critério estipulado pela ANP e o MME, o que ocorre é uma transferência de riqueza da Petrobrás e dos seus acionistas para os cofres dos barões dos combustíveis – e.g., grandes distribuidoras. Ou seja, a Estatal aniquila a concorrência no setor de refino e importação, subsidiando os preços às grandes distribuidoras – que no final cobram ainda mais caro dos consumidores, visto controlarem grande parcela do setor.
Todo esse contexto de formação de verdadeiros oligopólios, permite que a Petrobrás adote o falso discurso de praticar preços de mercado internacional, quando na verdade adota uma sistemática que visa a perpetuação do controle daqueles que já dominam o mercado. Portanto, além da PPI não se mostrar uma política benéfica ao consumidor na teoria, ela também não possui eficácia na prática.
Por tudo isso, a nova política de preços da proposta mostra-se uma solução promissora frente ao alto custo dos combustíveis no Brasil. Claramente inspirada por experiências internacionais, como por exemplo o Chile, que, desde 2014, passou a apostar no mecanismo automático de tributação. O país, por importar 69% de seu uso interno de combustíveis fósseis, é extremamente vulnerável à volatilidade do preço internacional do petróleo e, para enfrentar esse problema, criou o mecanismo de Estabilização dos Preços Combustíveis (MEPCO), um esquema tributário que opera incidindo no preço dos combustíveis por meio de aumentos ou reduções do imposto na medida em que os preços do barril sobem ou descem no mercado internacional.
Na Europa, a Dinamarca também adota modelo semelhante. Caso o preço médio anual do petróleo seja superior a US$ 75 por barril, passa a incidir um imposto suplementar de 5% sobre o lucro tributável, se o preço exceder US$ 85 por barril, será acrescentado um imposto de 10%. Dessa forma, o governo criou uma espécie de “alívio fiscal” para as empresas produtoras, as quais poderiam ser tributadas extraordinariamente à medida que o preço internacional do barril aumentasse, criando um espaço no orçamento para lidar com os efeitos negativos da flutuação do preço internacional para o consumidor final.
Espera-se que tudo isso conduza ao desenvolvimento industrial e tecnológico do parque de refino nacional, ao estipular tributos progressivos à exportação do petróleo bruto, desestimulando a exportação de derivados, e assim, evitando que o Brasil sofra as consequências econômicas da ‘Doença Holandesa’, fenômeno econômico causado por grandes descobertas de recursos naturais (i.e., commodities, como o petróleo, que embora provoque, no curto prazo, um aumento no PIB interno do país, acaba por aniquilar o setor industrial e agrícola no decorrer do tempo).
Nos Estados Unidos, por exemplo, para estimular o abastecimento interno e a produção de gasolina e de diesel, restringiu-se totalmente a exportação de petróleo bruto por mais de 40 anos. Isso provocou uma reviravolta no desenvolvimento industrial americano, que viu o seu parque de refino se modernizar em uma velocidade sem precedentes. A indústria, antes focada na extração do crude, voltou-se para a criação e modernização de refinarias capazes de processar os milhões de barris de petróleo produzidos diariamente, tornando os EUA um grande exportador de derivados, que obviamente possuem valor agregado e um spread bem mais significativo.
Trata-se, portanto, de um projeto de lei promissor que, caso aprovado, tem o poder de evitar as flutuações de preço vistas atualmente, criando previsibilidade e estabilidade ao mercado consumidor sem prejudicar o produtor e o importador, além de criar um ambiente que fomenta a construção de novas refinarias, o que diminuiria ainda mais a dependência da importação de combustível.
Alberto Felipe Lima Coimbra e Ana Carolina Meirelles Tavares